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03/07/2008
Bens adquiridos onerosamente pelas entidade familiares não instituídas pelo casamento antes da Constituição de 1988

Sabemos que o Direito de Família é um dos ramos do direito dos mais mutáveis, isso porque o seu objeto tem como ator principal, o ser humano, e como palco, a dinâmica e a evolução da sociedade. Em razão disso, se faz necessário que o Direito acompanhe as evoluções ocorridas nessa seara.

Considerando que o fim primordial do Estado é promover o bem estar de todas as pessoas, e estas quase sempre perseguem a boa fortuna, isto é, as relações de felicidade, sociabilidade e patrimonialidade, patente está o interesse da Constituição Federal em regular as entidades familiares instituídas ou não pelo casamento (art. 226, da CF).

Dessa forma, o art. 226 da Carta Soberana trouxe no seu bojo o reconhecimento de entidades familiares não instituídas pelo casamento.

A entidade familiar acima em comento é a união estável, nova roupagem que ganhou o concubinato puro, que antes da Constituição da República de 1988 não surtia efeitos no âmbito do direito familiar, e sim, no campo do direito obrigacional1.

Nesse sentido, o Professor Álvaro Villaça Azevedo2 exara que o concubinato puro nasceu principalmente por causa do descaso do legislador brasileiro, ao torpedear todas as formas antigas de constituição de família, principalmente o casamento religioso e o casamento de fato, que existiam nas Ordenações Filipinas, de 1603.

Nesta época, segundo Villaça, o casamento seria por palavras, de presente, à porta da igreja ou fora dela, com licença do prelado, tratando-se do casamento religioso; ou, então, per scriptura, perante duas testemunhas, documentado não por um documento ad solemnitatem - porque este não era exigido para validade do ato matrimonial -, mas ad probationen tantum, tão-somente para que as partes tivessem um documento desse ato de união; ou o casamento de conusudos, no qual todos aqueles - homem e mulher - que convivessem per tanto tempo (por muito tempo) ficavam conhecidos como marido e mulher - hoje união estável; naquela época, casamento de fato ou clandestino.

Bastava que um homem convivesse com uma mulher, por algum tempo, como se casados, com ou sem celebração religiosa, para que se considerassem sob casamento. Isso porque, nessa época, o concubinato puro, não adulterino nem incestuoso - que é utilizado hoje como modo de constituição de família - era o casamento de fato. Esse casamento de fato que, sob a singela forma de convivência no lar, selava a união dos cônjuges, sob o pálio do Direito Natural.

Em relação ao patrimônio, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, acolheu a idéia de que bastava a convivência entre os concubinos - concubinato puro, hoje união estável - para que houvesse o somatório dos bens adquiridos onerosamente durante a união concubinária, em igualdade de condições entre os companheiros, salvo estipulação expressa em contrário.

O mesmo posicionamento deu-se no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por acórdão relatado pelo então Des. Carlos Alberto Menezes Direito - hoje Ministro do Supremo Tribunal Federal. Esse mesmo entendimento foi admitido em decisão do Superior Tribunal de Justiça, e essa posição do Superior Tribunal de Justiça torpedeou a Súmula n. 380 do Supremo Tribunal Federal (Súmula 380 - comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua disssolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum).

Sociedade essa que se criou com fundamento no art. 1.363 do Código Civil, com aquele conceito aristotélico-tomista de que: Celebram contrato de sociedade as pessoas que somam esforços e/ou recursos para obtenção de fins comuns. No caso, o fim comum é a constituição da família de fato, que deve ter os seus parâmetros respeitados.

Pergunta-se: Alguém se negaria a reconhecer o status de companheiro a uma pessoa que permaneceu quarenta anos vivendo com outra em união more uxório antes da CF/88?

Pois bem, se a norma que alça o companheiro em união estável a uma condição equivalente em direitos ao cônjuge retroage, os efeitos patrimoniais podem retroagir, embora não digam diretamente com o conteúdo publicístico da norma.

Isto pode ocorrer porque a Constituição de 1967, com a Emenda nº 1, de 1969, já possuía previsão do Princípio da Isonomia ou da Igualdade. Logo, se a companheira pode ser reconhecida como tal mesmo antes da Constituição e, com maior razão, antes das leis que a regulamentam, e se o que se objetiva é uma equivalência de direitos entre cônjuge e companheiro, incide o princípio da isonomia, já previsto na ordem constitucional anterior, fazendo com que aquele que lá já era companheiro, por força da retroatividade, venha a ser considerada reconhecida a união, inobstante a lei ordinária à época não o considerasse como tal.

A jurisprudência3 se encarregou de sedimentar esse entendimento:

APELAÇÃO CÍVEL. UNIÃO ESTÁVEL. EXISTÊNCIA DECLARADA.
APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE MESMO ÀS RELAÇÕES INICIADAS ANTE DA CF/88.
SUB-ROGAÇÃO ALEGADA SEM INDUVIDOSA COMPROVAÇÃO.

1. A vida em comum aos moldes de uma entidade familiar é reconhecida pela recorrente que não é favorecida pela alegação de que o de cujus se mantinha casado, pois, na contestação, disse que ele se encontrava separado de fato quando se conheceram.

2. O esforço para que o período anterior à CF/88 seja caracterizado como uma sociedade de fato, com aplicação das distintas seqüelas patrimoniais, não vinga porque está sedimentando o entendimento jurisprudencial no sentido de que é possível o reconhecimento de uniões estáveis havidas antes do advento da Constituição de 1988.

3. A sub-rogação, para que gere a exclusão da comunhão parcial de bens, deve estar provada de modo contundente e esta prova não está nos autos. NEGARAM PROVIMENTO, À UNANIMIDADE. (Apelação Cível Nº 70014074009, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 24/05/2006).

AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE SOCIEDADE DE FATO PÓS MORTE.
VÍNCULO EXTINTO ANTES DAS LEIS Nº 8.971/94 E 9.278/96.
RETROATIVIDADE. IMPEDIMENTO. PROVA DO VÍNCULO E DA FORMAÇÃO DO
PATRIMÔNIO.
CONFISSÃO.

1. É reconhecida a existência de sociedade de fato e o direito à partilha, antes mesmo da edição das leis nº 8.971/94 e nº 9.278/96, não havendo o que se falar em aplicação retroativa dos aludidos diplomas normativos, visto que a jurisprudência já assegurava tal direito e a carta magna o consolidou.

2. Os depoimentos prestados demonstram que o relacionamento em apreço observava os requisitos legais, tendo as testemunhas sido uníssonas ao afirmar que o casal viveu como marido e mulher até o falecimento do "de cujus". Ademais, a própria recorrente, em sua peça contestatória reconhece a existência da união estável com o falecido.

3. Embora a recorrente fosse ainda casada no início do vínculo afetivo com o "de cujus", a união formada encontra respaldo legal no §1º do art. 1.723 do código civil, que assegura proteção aos separados de fato ou judicialmente.

4. Se as provas não deixam dúvida de que o falecido era pessoa trabalhadora, é possível se inferir que contribuiu para a constituição do patrimônio do casal. APELO NÃO PROVIDO. Tribunal: TJDF. Publicação no DJU: 13/7/2006. Registro do Acórdão Número: 248172. Relator: FLAVIO ROSTIROLA. Órgão Julgador: 1ª Turma Cível.

Classe do Processo:

APELAÇÃO CÍVEL 20040310002765APC DF.
CONSTITUCIONAL E FAMÍLIA UNIÃO ESTÁVEL.
RECONHECIMENTO.
DISSOLUÇÃO.
PARTILHA DE BENS.

1. Para a prova de união estável, mostra-se necessária a efetiva demonstração da convivência pública, contínua e duradoura, nos termos do art. 1.723 do código civil de 2002.

2. Na união estável, presume-se que os bens adquiridos, na constância da convivência marital, sejam frutos do esforço comum das partes, presunção legal a ser elidida com contundente conjunto probatório. Diante da ausência desse, viável a divisão do patrimônio na razão de 50% (cinqüenta por cento) para cada convivente. APELO NÃO PROVIDO. Tribunal: TJDF. Publicação no DJU: 28/3/2006. Registro do Acórdão Número: 239836. Relator: FLAVIO ROSTIROLA. Órgão Julgador: 1ª Turma Cível. Classe do Processo: APELAÇÃO CÍVEL 20040310043280APC DF.

Pese embora nesse lapso temporal (antes da Constituição da República de 1988) não houvera regramento tipificado em lex lata por inúmeros motivos (p.ex. político, religioso, etc.), inegável que a sociedade de fato e a comunhão patrimonial se efetivou.

E se o casamento constituiu-se em decorrência e posterior a união more uxório?

Neste caso, não se há de cogitar sobre consentimento judicial para substanciar o reconhecimento do direito pretérito insculpido, perfeito e acabado, ainda mais se as partes são maiores, concordes e consentiram na união (concubinato puro) - já que ninguém é obrigado a litigar caso não haja contenda (litis redemptio, art. 3º, do CPC).

Isto posto, modestamente concluímos, em tese, que os bens adquiridos de forma onerosa, tendo cada um contribuído em comum para a aquisição dos bens na constância da união more uxório –não instituídas pelo casamento antes da Constituição Republicana de 1988 – são comunicáveis, salvo prova em contrário.

Em tempo: Aliás, essa situação fática com contornos jurídicos frequentemente se opera e pode ventilar-se sobre as hipóteses dispositivas da Lei 11.441/07, precisamente nos Inventários e Partilhas extrajudiciais.

Bibliografia

1 - Eis que com a dissolução da relação concubinária, haveria divisão de bens entre os companheiros desde que comprovada a participação de um ou outro para a formação da fortuna, ou, caso não fosse possível prová-lo, poder-se-ia exigir indenização por prestação de serviços. Concubinato impuro é considerado aquele em que um ou ambos dos partícipes têm vínculo matrimonial com outra pessoa.

2 - Álvaro Villaça Azevedo é Professor Titular de Direito Civil e Regente de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo; Professor Titular de Direito Civil e de Direito Romano da Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie, em São Paulo; Professor Titular de Direito Romano e Diretor da Faculdade de Direito da Fundação Armando Alvares Penteado - FAAP, em São Paulo; Advogado, Parecerista e Consultor Jurídico.

3 - Jurisprudência cedida gentilmente pelo professor Francisco José Cahali.

Autor: Felipe Leonardo Rodrigues é bacharel em Direito, Especializando em Direito Notarial e Registral, colunista do boletim eletrônico INR-SERAC e atua no 26º Tabelionato de Notas de São Paulo.

Fonte: Site da ARPEN SP

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