Fabio Serapião
ESPECIAL PARA AGÊNCIA ANHANGUERA cidades@rac.com.br
O número de divórcios formais na região de Campinas aumentou 199% desde julho deste ano, quando entrou em vigor a nova regra do divórcio rápido, em comparação ao mesmo período de 2009. O aumento é superior ao registrado no Estado de São Paulo, que foi de 149%. De acordo com dados fornecidos pela Seção de São Paulo do Colégio Notarial do Brasil, somados os meses de julho e agosto, a região viu o número de casos saltar de 85 divórcios oficiais, em 2009, para 254 casos este ano.
A Emenda Constitucional 66, que acrescentou à lei número 11.441/2007 mecanismos que facilitam o processo de divórcio, extinguiu a necessidade do cumprimento prévio da separação judicial por mais de um ano ou separação de fato por mais de dois anos. Publicada no dia 14 de julho, a medida vale para casais que não possuem filhos menores de idade e beneficia pessoas como a montadora Luciane Fraga e Klock, de 33 anos, que necessitava se desvincular do antigo parceiro para conseguir o financiamento da casa própria. Não tem motivo para esperar um ano para se divorciar. Se a pessoa já decidiu não é uma lei que deve proibir ou atrapalhar que ela faça isso , afirmou Luciane.
Além de diminuir a interferência do Estado na vida dos casais, a nova regra teve como objetivo economizar recursos técnicos e financeiros do Judiciário. Para Nilza Robaina, oficial substitua do 2º Cartório de Registro Civil de Campinas, a medida atingiu seu objetivo ao acabar com a burocracia envolvida no processo. Com a lei, para que o divórcio seja efetuado, basta que o advogado representante do casal se dirija a qualquer tabelionato de notas com a certidão de casamento, RG e CPF de ambas as partes.
Para a costureira Jocélia de Jesus Santos, de 30 anos, mais que agilizar o processo, a nova lei acaba com a humilhação que os casais eram obrigados a passar até conseguirem se separar oficialmente. A separação por si só já é difícil. O lado emocional conta muito e agora com a nova lei não é preciso mais se expor por muito tempo para um juiz e para a própria sociedade , disse. A costureira também se diz surpresa com a facilidade que encontrou para obter novamente seu nome de solteira. Mesmo com a negociação para ver com quem ficaria a nossa casa, dois meses depois de entrar com os papéis já posso assinar meu nome de solteira , completou Jocélia.
Na época de sua implantação, a lei gerou debates entre diversos setores da sociedade, entre eles a Igreja. A presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Campinas, Tereza Dóro, é defensora da nova lei e diz acreditar que a medida não envolve questões religiosas. Para ela, a lei provou, aos que eram contra, que ela é uma evolução do sistema jurídico brasileiro, mas pede atenção aos casais na hora de escolher o advogado que vai representá-los no processo.
A lei sem dúvida é uma evolução, mas é necessário cautela. Os casais devem ficar espertos com as indicações de profissionais na porta dos cartórios. Isso pode prejudicar o que a lei facilita , salienta Tereza.
Para ela, o aumento nos números de divórcios deve voltar ao seu nível normal em pouco tempo. Esse aumento significativo que foi notado é por conta daqueles casais que já aguardavam para obter o divórcio. Daqui para a frente, os índices devem se manter no patamar que estavam antes da implantação da lei , concluiu.
SAIBA MAIS
De acordo com a Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade), no ano de 2008 foram celebrados 39.093 casamentos na região de Campinas. Isso significa uma média de 107 matrimônios realizados por dia.
Desse total, 13,1% foram no mês de dezembro e 25% uniram mulheres com idade superior ao do parceiro. Os dados do Seade mostraram também que os homens paulistas casam-se em média com 31 anos e as mulheres com 28.
Casamento religioso não se enquadra
Para Dom Bruno Gamberini, arcebispo de Campinas, o aumento no número de divórcios na região é preocupante, mas os índices não dizem respeito à Igreja. Para ele, é preciso diferenciar os contratos civis de casamento dos matrimônios efetuados dentro das tradições católicas, onde homem e mulher juram seu amor perante a imagem de Jesus Cristo. Nesses casos, o casamento é um sacramento e os números relativos ao divórcio se mantêm baixos. Os casamentos realizados apenas como contrato civil não são classificados como matrimônio pela Igreja. Para nós, o que Deus uniu, o homem não separa , salientou o arcebispo.
Ainda segundo dom Bruno, em caso de divórcios para casamentos efetuados dentro das tradições católicas existe o Tribunal Eclesiástico. Localizado na Cúria Metropolitana, o tribunal tem como função corrigir eventuais problemas nos matrimônios. Não acreditamos que seja impossível um casal notar que se enganou ao realizar o casamento, mas isso ainda é pouco frequente e o tribunal tem como função corrigir esses erros , afirmou. (FS/AAN)
Vínculos matrimoniais devem ser estimulados
Magistrado diz que lei pode banalizar a união e jogar fora a responsabilidade
A lei do divórcio rápido pode estimular a banalização do casamento, segundo o juiz Fábio Toledo, da 2ª Vara Cível de Campinas. O magistrado, que atuou de 1998 a 2005 na Vara da Família da cidade, disse que é preciso estimular os vínculos matrimoniais para que sejam perenes. Quando você facilita demais o divórcio ou a separação, você os banaliza e joga fora a responsabilidade , disse.
Toledo lembra ainda que o fim de um casamento pode afetar os filhos, os noivos e a própria sociedade. Há crianças envolvidas e a própria sociedade, que depende do sucesso desse projeto de vida em comum. Então a preocupação que tenho é que pode haver uma facilitação excessiva. O divórcio acaba sendo a frustração de um projeto de vida, ainda segundo o juiz.
O magistrado lembra que há situações em que a sociedade conjugal faliu e que é impossível manter a vida em comum. Ninguém duvida que há situações em que não há como manter a vida conjugal , disse. (AAN)
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