Moradores e proprietários de lotes no Condomínio Privê 1 enfrentam a truculência de homens armados que invadem áreas para revendê-las. As autoridades policiais temem que os conflitos resultem em mortes
HELENA MADER
Homens armados, capatazes que se comunicam por rádio, cercas destruídas, ameaças de morte. A disputa por terras na capital do país transformou uma das áreas mais nobres da cidade em um faroeste. A venda irregular do mesmo lote a diversos compradores e a atuação de grileiros na região do Condomínio Privê Lago Norte 1, à beira do Lago Paranoá, são hoje o principal motivo de registro de ocorrências na 9ª Delegacia de Polícia. "Nossa grande preocupação é que esses conflitos e ameaças acabem em morte", afirma o delegado chefe da unidade, Silvério Moita.
Os terrenos que estão no centro da disputa ficam em terras públicas, de propriedade da Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap). Ao todo, o Privê do Lago Norte 1 tem 280 lotes, 200 deles ocupados. Os 80 imóveis vazios são o grande alvo dos criminosos que agem no local.
Além de visar os terrenos demarcados, eles também criam novos lotes em áreas de preservação permanente (APP) e em espaços reservados para abrigar equipamentos públicos no futuro, como postos de saúde ou escolas.
Derrubadas
Os moradores mais antigos e a administração do condomínio juntaram dinheiro para colocar cercas e guaritas no local e, assim, tentar controlar o acesso dos invasores. Os lotes ambientalmente sensíveis receberam placas de sinalização, com telefones para denúncia. Mas durante a madrugada, os grileiros derrubam os piquetes nos fundos do parcelamento, entram com caminhões repletos de material de construção e, em pouquíssimo tempo, demarcam terrenos e constroem muros.
Quando o antigo comprador do imóvel chega para construir ou visitar seu terreno, encontra o lote cercado, muitas vezes vigiado por homens pagos pelos grileiros.
Os casos vão parar ou na Justiça, ou na polícia. A advogada Carla (nome fictício), 29 anos, passou por essa desagradável experiência no começo deste ano. Ela mora com o marido e os dois filhos na casa do pai, no Privê Lago Norte 1. A família mantém outro lote vazio no mesmo condomínio desde 1992, para que Carla pudesse construir a própria casa no futuro. Mas a advogada decidiu respeitar a proibição de construir no parcelamento e aguardava o momento certo para começar as obras. Em maio, ela foi surpreendida pela construção de um muro em seu lote. "Um dia eu estava chegando na casa do meu pai quando vi um caminhão lotado de material de construção encostado em frente ao meu terreno.
Fiquei muito assustada e tentei impedir que os funcionários descarregassem o material.
Entrei na frente do caminhão, mas o homem que comandava a invasão mandou que os pedreiros passassem por cima de mim.
Ele agia com muita violência, me ameaçou. Estamos todos apavorados", afirma. A advogada recorreu à polícia e à Justiça, com um pedido de reintegração de posse. Com isso, conseguiu impedir a tentativa de invasão, pelo menos temporariamente.
Medo e ousadia
Até mesmo os representantes da administração do Privê Lago Norte 1 têm medo de aparecer, diante da violência e da ousadia da quadrilha que tenta invadir a área. Um dos diretores do condomínio conta que vai à 9ª Delegacia de Polícia pelo menos duas vezes por semana. "Por conta do nosso trabalho para impedir as invasões, estamos sendo ameaçados de morte. Recebo ligações durante a madrugada", reclama um integrantes da administração do parcelamento. "Minha família está com muito medo.
Mas precisamos agir, já que chamamos a fiscalização, denunciamos ao governo e ninguém faz nada", reclama o dirigente do condomínio.
Localizado ao lado do Setor de Mansões do Lago Norte, com vista privilegiada para o Lago Paranoá, o Privê Lago Norte 1 é muito visado por conta da valorização rápida da área. O condomínio é irregular, mas já tem projetos urbanísticos e o processo de regularização fundiária está em andamento. No início do ano passado, um lote no parcelamento custava R$ 40 mil. Hoje, os mesmos imóveis não saem por menos de R$ 200 mil. Um dos grileiros que atuam no Privê criou e vendeu seis lotes em área de preservação permanente.
Ou seja, ganhou pelo menos R$ 1,2 milhão com a ação criminosa.
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